Três grandes artistas circenses do passado acidentalmente se reencontram, depois de muitos anos, na antessala de uma agência de empregos. Eles sabem que só um será escolhido. Nesse dia, suas amizades, memórias, segredos, pequenezas e vilanias serão expostos, criando, dessa maneira, uma ode ao ofício do ator e uma profunda reflexão sobre os fundamentos filosóficos da carreira artística.
A sala de espera desse teste de casting – que nunca acontece – revela-se um não-lugar, um limbo onde essas três figuras se veem condenadas a rever suas escolhas éticas e estéticas, num exercício infinito de reflexão sobre a resiliência do artista, a urgência da Arte e a sacralidade do ofício. Essa é a temática de “Adeus, Palhaços Mortos”, baseada no texto do romeno Matei Visniec.
A peça será apresentada na CAIXA Cultural Curitiba (Rua Conselheiro Laurindo, 280), de 31 de agosto a 2 de setembro, sexta e sábado, às 20h e domingo, às 19h. Os ingressos começam a ser vendidos na bilheteria do teatro a partir do dia 25 de agosto, e custam R$ 30 e R$ 15 (meia). A classificação etária é de 12 anos.
O espetáculo recebeu o prêmio Shell de Melhor Cenário, o Prêmio Aplauso Brasil de Melhor Espetáculo de Grupo e o prêmio de Melhor Direção pela Associação dos Produtores de Teatro do Rio de Janeiro (Prêmio APTR). A montagem representou o Brasil no Festival “World Stage Design 2017” em Taipei (Taiwan) e nos Festivais Internacionais de Trabzon e Antália, ambas na Turquia.
A Academia de Palhaços se encontra com a obra de Matei Visniec
A Academia de Palhaços foi fundada por atores do curso de Artes Cênicas da Unicamp. Em 2018 comemora 11 anos de sua trajetória de pesquisa e produção teatral continuadas. A companhia deu início a uma investigação cênica sobre o palhaço de picadeiro brasileiro e, nos 10 espetáculos produzidos até o momento, transitou pelo universo do ator popular. Cinco desses espetáculos foram realizados sobre uma Kombi-Palco num projeto de teatro itinerante.
Em 2015, essa Kombi pegou fogo e teve queimados os cenários, figurinos, palco e equipamentos de som e iluminação. Diante dessa catástrofe, que reduziu anos de trabalho literalmente a cinzas, a companhia viu seu próprio fim. Dois de seus integrantes desistiram do teatro.
Dispostas a seguir com o trabalho, restaram as artistas Laíza Dantas e Paula Hemsi que tiveram de lidar com o inevitável fim, assim como enfrentaram o recomeço e a mudança de ciclo. Diante da necessidade de se reinventar, convidaram o diretor José Roberto Jardim justamente no intuito de reler sua trajetória artística a partir de outras lentes.
Jardim respondeu ao chamado da companhia trazendo o texto “Um Trabalhinho Para Velhos Palhaços” de Matei Visniec, que trata justamente de três artistas circenses diante do fim de suas existências, de suas carreiras e da Arte. Uma metáfora perfeita para catalisar artisticamente o momento de fim/recomeço da Academia de Palhaços e seus atores.
Essa empreitada entre a companhia e o diretor, apoiada pelo Programa Municipal de Fomento ao Teatro para a Cidade de São Paulo, reúne também uma premiada equipe de criadores: Tiago de Mello, o diretor musical, é um dos expoentes mais profícuos da música experimental eletroacústica do Brasil; o cenário e as vídeo projeções ficaram a cargo do Coletivo BijaRi, um grupo de arquitetos, artistas plásticos e videomakers especializados em instalações e mapping. Já o figurino foi criado e desenhado pelo estilista Lino Villaventura; e o visagismo é assinado por Leopoldo Pacheco. Essa equipe e suas contribuições alçaram o projeto a novos patamares. Em cena estão os atores Laíza Dantas, Paula Hemsi e Maurício Schneider.
O texto original de Matei Visniec conta a história de três palhaços velhos num tom de comédia do absurdo, ao melhor estilo de seu conterrâneo Eugène Ionesco. Já a adaptação assinada pelo diretor José Roberto Jardim essencializa o texto, universalizando muitas de suas questões, deixando suas contradições mais aparentes e o transformando num ácido mergulho existencial sobre o fazer artístico. A encenação potencializa ainda mais a adaptação ao reduzir elementos, apostando no minimalismo e na essencialidade, traços marcantes da assinatura de Jardim como diretor.
“Cada cena é um recorte num espaço-tempo descontínuo e fragmentado. São fotogramas vagando nas memórias individuais e coletivas daquela trupe circense. São vozes do passado ecoando em busca de algum sentido” diz o diretor José Roberto Jardim.
O espectador, ao ser impactado pela violência dos deslocamentos espaço-temporais, é convidado a um passeio pelas questões que movem esses velhos artistas desde seu passado de glória até seu inevitável futuro. “Propusemos uma experiência sensorial que transita entre o abismo da morte e a devoção de uma vida voltada à Arte e que, portanto, mira a imortalidade”, conclui Paula Hemsi, uma das atrizes da Academia de Palhaços.
As informações são da jornalista Maria Celeste Corrêa e as fotos de Victor Iemini.