Obras passaram por um resgate de ponta a ponta, e hoje podem ser apreciadas em exposição permanente no Memorial Paranista, em Curitiba.
O escultor João Turin (1878-1949) contou com o privilégio de ter todo o trabalho de sua vida resgatado de ponta a ponta, em uma iniciativa até então inédita na área das artes no Brasil. A família Ferrari Lago, responsável pela gestão do legado artístico de Turin, coordenou uma equipe para realizar as etapas deste processo, entre elas fundir em bronze suas esculturas mais representativas, pois a maioria das obras deixadas pelo artista estava em gesso. Hoje elas podem ser apreciadas em exposição permanente no Memorial Paranista, em Curitiba.
Antes de chegar a este resultado, inúmeras etapas foram cumpridas para a catalogação do acervo, respeitando-se os critérios museológicos, o que inclui numeração, higienização, e preservação das peças, chegando a 410 obras registradas entre esculturas, pinturas, desenhos, projetos de design (inclusive em arquitetura e moda), esboços e outros trabalhos.
Para fundir as esculturas em bronze, foi montada uma fundição elétrica, moderna e ecologicamente correta, em que foram produzidas pouco mais que 100 modelos selecionados, durante o período de 2012 a 2014. “As obras de grande porte tiveram sua dificuldade. Talvez a mais difícil tenha sido Pedagogia devido a sua riqueza de detalhes, assim como Pietá”, relata o produtor cultural Mauricio Appel.
Processo de ampliação das obras
Construído e administrado pela Prefeitura de Curitiba, o Memorial Paranista reúne cerca de 100 obras de Turin graças a uma junção de esforços. 78 esculturas em tamanho original foram doadas pela Família Lago para o Governo do Estado do Paraná, que emprestou os trabalhos à Prefeitura de Curitiba em regime de comodato. O Jardim de Esculturas possui obras ampliadas (como “Marumbi”, com 3 metros de altura e 800 quilos), sendo que 3 foram doadas pela Companhia Paranaense de Energia (Copel), por meio da Lei Rouanet (de incentivo à cultura), enquanto as demais foram compradas pela Prefeitura.
As obras deixadas por João Turin, em sua maioria eram gessos que tinham em média 40 centímetros de altura. Para chegar aos exemplares em grandes proporções, foi feito um processo de ampliação (por uma experiente empresa da Califórnia, nos EUA), em que se fabrica o molde no tamanho desejado, para em seguida realizar a fundição, que resulta na escultura ampliada. “É muito complexo fazer isso da forma tradicional. Existem métodos antigos de se fazer ampliação manualmente usando proporções e determinados instrumentos”, comenta Samuel Ferrari Lago, um dos detentores dos direitos autorais do artista.
As obras ampliadas de João Turin foram feitas com tecnologias avançadas, aliadas com técnicas tradicionais. Os moldes foram produzidos com impressoras 3D a partir de um minucioso processo de digitalização tridimensional das esculturas originárias, com um scanner específico. Samuel Ferrari Lago explica que as novas tecnologias trazem um resultado mais fiel à obra originária, além de poupar tempo na produção. “Os benefícios são imensos. Porém o que fizemos foi aliar os métodos mais modernos com as técnicas milenares como a da cera perdida, muito utilizada para fundições em bronze. Unimos o melhor dos dois mundos, sempre pensando pra frente, mas sem descartar métodos clássicos que funcionam bem. O resultado é notável”, afirma.
Doação
A Família Ferrari Lago doou ao Memorial Paranista equipamentos de fundição utilizados para produzir as obras em bronze de Turin, que assim substituíram antigos aparatos existentes no local, que estavam obsoletos.
“Isso propicia aos novos artistas meios para fundir suas peças, estimulando e ajudando o desenvolvimento da arte escultórica paranaense. Acreditamos que seria o que João Turin gostaria de ver, pois ele mesmo teve imensa dificuldade em fundir suas peças à sua época, deixando muitas obras inéditas”, comenta Samuel Ferrari Lago.
Recentemente, no ateliê do Memorial Paranista, foi realizada a fundição em bronze da releitura da obra perdida “No Exílio”. A artista Luna do Rio Apa realizou a releitura em argila, a partir de fotografias de época, resultando em uma imponente escultura com 2,70m de altura e mais de 300 quilos. A feitura da obra em bronze foi possível graças a uma parceria em que a Família Ferrari Lago cedeu o molde em silicone para a Prefeitura de Curitiba/FCC, para que esta pudesse fundir a escultura, hoje incorporada ao acervo municipal da cidade.
Muitos podem imaginar que uma obra com estas proporções seja feita em um molde do tamanho da escultura, porém, este processo é feito em partes. “Você não consegue fazer uma fundição de uma obra inteira com este tamanho por causa do ar dentro da forma. Além disso, ficaria muito mais difícil o manuseio e o acabamento”, relata Mauricio Appel. “No Exílio foi feita em nove partes, que depois foram soldadas, usando o mesmo bronze utilizado na fundição”, explica.
Sobre João Turin
Nascido em 1878 em Morretes, no litoral do Paraná, mudou-se ainda garoto para a capital Curitiba, iniciando seus estudos em artes, chegando a ser professor. Especializou-se em escultura em Bruxelas e em seguida morou por 10 anos em Paris.
Retornou ao Brasil em 1922, trazendo comentários elogiosos da imprensa francesa, e deu início à etapa mais produtiva de sua trajetória. Foi premiado no Salão de Belas Artes do Rio de Janeiro em 1944 e 1947. Faleceu em 1949 e é considerado o maior escultor animalista do Brasil, precursor da arte escultórica no Paraná e um dos criadores do movimento artístico e cultural conhecido como Paranismo. Os trabalhos do artista compõem acervos de 15 museus e instituições do Brasil, além de possuir obras em locais públicos do Paraná, Rio de Janeiro e França. Em sua homenagem, foi inaugurado o Memorial Paranista, em Curitiba, que reúne 100 obras.
Em junho de 2014, seu legado foi prestigiado pelas 266 mil pessoas que visitaram “João Turin – Vida, Obra, Arte”, a exposição mais visitada da história do Museu Oscar Niemeyer, em Curitiba, que ficou em cartaz por 8 meses e foi citada em um ranking da revista britânica The Art Newspaper. Esta exposição também recebeu o Prêmio Paulo Mendes de Almeida, da ABCA - Associação Brasileira de Críticos de Arte, de melhor exposição do ano, e teve uma versão condensada, exibida em 2015 no Museu Nacional de Belas Artes, no Rio de Janeiro, e em 2016 na Pinacoteca de São Paulo.
Serviço:
Memorial Paranista João Turin
Rua Mateus Leme, 4700 (Curitiba, Paraná).
Agendamento de visitas no site www.curitiba.pr.gov.br/memorialparanista
Site sobre João Turin: joaoturin.com.br
Redes sociais: @escultorjoaoturin e facebook.com/escultorjoaoturin
Informações: Rodrigo Duarte
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