Crianças e educadores quilombolas são os primeiros a receber gratuitamente o livro “Cadê a Perna do Pererê?”, em alusão ao mito do folclore brasileiro.
A escritora paranaense Joanita Ramos vai espalhar mil exemplares gratuitos de seu livro infantojuvenil “Cadê a Perna do Pererê?”, ilustrado por Márcia Széliga, (Editora Cântaro) em alusão ao “Dia do Saci” que se comemora em 31 de outubro e que – segundo ela defende – “é, ou deveria ser, uma festa mais significativa para os brasileiros do que o tradicional ‘Hallowen’”.
A distribuição começou esta semana entre crianças e educadores do Quilombo Palmital dos Pretos, situado a cerca de 85 quilômetros de Curitiba. “Fazer o pré-lançamento numa comunidade preta rural tem tudo a ver comigo e com o livro”, diz ela, que é branca e integrante de uma família interracial. Explica que buscou, nessa obra, oferecer uma possibilidade de as crianças pretas ou pardas, e também as que têm deficiência física, encontrarem protagonistas com as quais possam se identificar – o que ainda não é frequente nas bibliotecas e livrarias tradicionais.
O livro chama a atenção para o fato de que o Saci, uma das figuras mais queridas da mitologia brasileira não só é preto, como é PCD (pessoa com deficiência). Assim como é preto e Negrinho do Pastoreio – personagem mitológico que foi escravizado e, segundo a lenda, castigado até a morte por não ter conseguido encontrar um potro perdido.
“O folclore brasileiro é ‘um prato cheio’ para os pais e educadores alimentarem conversas que atualizem as noções de escravização e propiciem abordagens sobre a diversidade humana”, enfatiza a autora.
E exagera, brincando: “A Cuca, por exemplo, é uma ótima personagem para se entender a bipolaridade das mães e professoras” (risos).
Em “Cadê a Perna do Pererê?” Joanita conta a história de Sofia, menina leitora preta. Ao descobrir que o Saci Pererê não tem uma perna, a garota pede ao Negrinho do Pastoreio que vá em busca do membro perdido. Ao final da história, revela-se que Sofia, assim como o Saci, também teve uma perna amputada, o que não a impede de viver com alegria, utilizando os recursos da ciência para uma vida permeada de atenção, afeto e imaginação, como é o direito de qualquer criança.
O livro já está disponível gratuitamente na versão digital (https://www.containercultural.com/sofiaeosaci), mas, segundo a autora, o melhor modo de democratizar a literatura infantojuvenil é distirbuir o livro físico gratuitamente a crianças da escola pública, pois muitas ainda não têm acesso a meios digitais ou não têm a cultura de consumir livros eletrônicos.
Além das oferecer às crianças um pouco de poesia e ilustrações de qualidade, o objetivo é estimulá-las à aceitação de si mesmas e dos colegas, em suas peles de diversos tons e em seus corpos, ainda que sejam "fora de padrão".
O Projeto foi aprovado com o apoio da Prefeitura de Campo Largo e realizado com recursos da Lei Paulo Gustavo – Ministério da Cultura – Governo Federal. A intenção, que a autora encara como desafio, é empreender novos projetos, sensibilizar gestores e obter apoio para que o livro chegue a crianças de todo o Brasil, e gratuitamente às escolas públicas. “Os mil livros são só o começo... Esse Pererê vai bem mais longe”, afirma.
No dia 30 de outubro haverá o lançamento oficial do livro, na Casa da Cultura de Campo Largo.
JOANITA RAMOS é jornalista, escritora, diretora de produção cultural e educadora. Mestre em Educação pela UFPR. Entre os vários prêmios e homenagens recebidas destacam-se o título Jornalista Amigo da Criança, concedido pela Rede Andi/Unicef e Fundação Abrinq, por textos em defesa da infância e adolescência no Brasil; Troféu Dignidade Solidária (1999), como Jornalista Destaque; Placa de Homenagem da Rede Paranaense de Comunicação, pela atuação como Coordenadora do Projeto Ler e Pensar; e Prêmio Outras Palavras, de Obras Literárias, da Secretaria de Estado da Cultura/PR, pelos textos Patraca, o Palhaço Astronauta e Tíbeti, o Gnomo, escritos por ela para ciranças, e montados pela Companhia Filhos da Lua e Companhia do Abração, respectivamente. Foi também finalista da primeira edição do Prêmio Ayrton Senna de Jornalismo e professora convidada de pós-graduação em Jornalismo Literário da Academia Brasileira de Jornalismo Literário - ABJL. Atuou como jornalista, por 10 anos, em Suplemento de Cultura no Paraná, e teve textos dramatúrgicos encenados por diretores como Mauro Zanatta, Enéas Lour, Maurício Vogue e Letícia Guimarães (Cia. do Abração).
Informações: Antonio Carlos Domingues
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